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COLUNAS


Luis Alcubierre


Luis Alcubierre é jornalista e publicitário. Começou sua carreira no Sistema Jornal do Brasil e na Rádio Eldorado, tendo migrado para a Comunicação Corporativa no final dos anos 80, quando iniciou na Comunicação Interna da Dow Química. De lá para cá, estruturou as áreas de Comunicação da TNT Express Worldwide, da Redecard e da Atento, na qual também esteve à frente do Marketing. Ao voltar de uma experiência na Europa, onde liderou a área global de Marca e Comunicação da então empresa do Grupo Telefônica,  assumiu a Diretoria de Comunicação Institucional da Samsung para a América Latina e hoje está à frente da Comunicação Institucional da Pernambucanas. 

Terapias da Comunicação para patologias nas organizações

              Publicado em 27/02/2014
Meu último artigo “Como descobri a Comunicação Biomédica” nasceu deste texto que trago agora aos associados da Aberje. Ele foi escrito por um grande amigo e especialista em Comunicação Organizacional, Enrique Sueiro. 
 
Terapias da Comunicação para Patologias nas Organizações” foi publicado originalmente no jornal El País, em 2009. De lá para cá as organizações se modernizaram bastante na gestão da comunicação, mas dificilmente o que Sueiro traz terá prazo de validade vencido.
 
Communicagement. 
Terapias da Comunicação para patologias nas organizações 
por Enrique Sueiro*
 
Ao ler o livro do pensador e PHD em Economia, Javier Fernández Aguado, chamado “Dirigir e Motivar Equipes”, entendi que management - até então uma novidade para mim -, tinha muito a ver com communication, assunto sobre o qual venho trabalhando há mais de 20 anos. Graças à inspiração de seu pensamento, passei a juntar ambas ideias em um único conceito, o qual passei a chamar de Communicagement. Em resumo, ele procura explicar que só é capaz de gerenciar quem sabe se comunicar. 
 
Comunicação interna como identidade institucional de uma Organização
 
Da mesma forma que as doenças se agravam em uma eventual combinação de males, como a síndrome metabólica ou um câncer metastático, a falta de uma comunicação estruturada é capaz de criar ambientes hostis nas empresas, levando-as a uma crise de proporções complexas em toda a sua estrutura. Se por outro lado, o paciente ou a empresa vítimas de sintomas que os desequilibre receberem uma combinação de tratamentos, estes poderão aproveitar-se dos efeitos curativos que vão além de uma patologia concreta. Trata-se de uma espécie de contágio benigno devido à proliferação de células comunicacionais de regeneração corporativa, com o perdão da analogia. 
 
Assim como o autoconhecimento é fundamental para as pessoas, também é preciso avaliar a comunicação institucional a partir de dentro das empresas. Dessa forma, proponho considerar a comunicação interna como o berço da identidade institucional de uma Organização, pois ela requer mais cuidados do que qualquer outra. Ao mesmo tempo em que a comunicação lubrifica ou emperra a relações entre pessoas, a mesma atua nas empresas no sentido de promover a qualidade e o equilíbrio ou, pelo prisma mais pessimista, infectar o seu ambiente interno, seu ânimo coletivo e sua alma corporativa.
 
A princípio, se não construirmos uma marca por dentro ou se não iniciarmos processos comunicacionais a partir da intimidade de nossas empresas, uma infecção pode ser provocada e esta poderá gerar novas doenças e multiplicar a gravidade de outras em curso, sejam elas diagnosticadas ou não. Lembrando que, se avaliamos os problemas preventivamente, a efetividade terapêutica do tratamento aumenta.
 
Seguindo as patologias descritas no livro de Aguado, podemos esboçar algumas terapias de eficácia variável; a gravidade da doença, seu sistema imunológico e outros fatores que exigem um tratamento individualizado. Contextualizada nesse cenário, uma vantagem competitiva geral da comunicação tem sua raiz nos efeitos saudáveis simultâneos e não excludentes que ela pode gerar para os males corporativos e que atingem as pessoas, como a anemia, a artrose, a esquizofrenia, a miopia, a cegueira, o estresse ou a depressão – efeitos estes descritos em diversos ensaios ao redor do mundo. 
 
A Comunicação começa pela escuta
 
Muitos têm discutido a respeito deste assunto. E não é de hoje. Ainda que pareça paradoxal para alguns executivos, a comunicação, sim, começa pela escuta. Por isso, os melhores médicos são conscientes do valor que existe em prestar a máxima atenção ao paciente como meio eficaz de diagnóstico, de ânimo e terapia. A escuta é decisiva para algo tão intangível, mas real e necessário para a gestão das percepções. Para isso, nada melhor do que aplicar a regra do 80/20 que confronta o escutar e o falar, e dedica muito mais tempo à primeira que à segunda ação. O líder do passado sabia falar. O do futuro sustenta sua eloquência na escuta empática. Este princípio da comunicação requer dedicação e altas doses de paixão por parte das pessoas, além de compromisso com a realidade. 
 
A escuta do líder provoca efeitos de alívio imediato ao menos em três direções estratégicas:
 
    1. Na equipe: motivação entre os colaboradores, que se sentem respeitados, ouvidos e, muito provavelmente, compreendidos. 
    2. Na organização: detecção de problemas que, de outra forma, seriam ignorados e, consequentemente, não seriam resolvidos.
    3. Nos líderes: o prestígio interno crescente e o efeito contagioso da admiração e do respeito, com consequências no fortalecimento de sua autoridade e de sua capacidade de transformar problemas em soluções.
 
O líder comunica a toda hora
 
O “escutar” não é apenas relevante quando um colaborador pode falar com um líder. Para que isso ocorra, o líder deve gerar uma confiança prévia que é materializada, sobretudo, de maneira informal. A partir disso a efetividade da “gestão de corredor” ou o “bate-papo informal do café”, será maior quanto mais esse líder for capaz de dizer às pessoas “olá”, “bom dia”, “muito obrigado pelo trabalho que têm realizado” e até mesmo um “posso ajudar em alguma coisa?”. No âmbito da liderança tudo comunica porque tudo gera percepções entre as pessoas da equipe. Não apenas o que um líder diz ou faz, mas também aquilo que não diz e não faz. 
 
Dizer o que faz e fazer o que diz
 
A partir da comunicação, uma simples artrose pode facilmente desembocar com o tempo em uma esquizofrenia, caso não sejam estabelecidos detectores dos chamados KDG (Knowing Doing Gap). Na prática, o estímulo motivador de algumas palavras ou gestos têm correlação com a decepção provocada pelos eventuais resultados que eles geram. Há uma frase, no entanto, que ajuda a combater essa eventual esquizofrenia. Ela é tão fácil de escrever como também difícil de praticar: “dizer o que faz e fazer o que diz”.
 
Algumas organizações sacrificam a verdade para, paradoxalmente, preservar o bom ambiente. Isso ocorre, por exemplo, quando elas ocultam ou maqueiam informações a seus empregados com o honroso objetivo de não desanimá-los com fatos e dados que eventualmente podem decepcioná-los. Perceba que a decisão já começa no campo das hipóteses. Quando as empresas manifestam certa incompetência em sua liderança, estas acabam por exibir uma imaturidade na gestão e uma miopia de sensibilidade. Essa patologia comunicativa é uma maneira de praticar com fatos e negados com palavras, que os fins justificam os meios. Seria importante perceber que no melhor dos casos, o remédio de calar-se e negar as más notícias apenas tem efeito no curto prazo.
 
Algumas perguntas surgem com frequência entre as principais lideranças: “que poderíamos fazer para que as pessoas não pensem que somos incoerentes, injustos ou incompetentes?” Uma primeira resposta é: para começar, deixe de assumir essas “qualidades”, que acabam por surgir a partir do terreno das percepções de quem ainda não sabe o que está ocorrendo. A melhor comunicação não arruma a pior realidade, mas contribui a uma melhor percepção. A opção de manipular, tão antiga como a humanidade, é uma possibilidade tentadora e muito eficaz em ambientes onde impera a mediocridade, a autocomplacência e o déficit de autocrítica. Como é muito explícita aos olhos e aos ouvidos, ou seja, é comum de ocorrer, ninguém reconhece esses tumores nas organizações e são justamente eles que precisam ser combatidos.
 
Prever o previsível e contar o possível de ser contado
 
Depois de uma conferência em Barcelona sobre comunicação interna, alguém me perguntou como deveríamos contar aos funcionários um iminente corte de pessoal. Primeiro não deveríamos esperar que a urgência dominasse o nosso planejamento porque, na comunicação, tão importante como a bússola, é o relógio. E também a sensibilidade. O importante não é dar uma resposta, mas fazê-la no tempo certo e com o conteúdo adequado. A gravidade no atraso quase sempre deixa sequelas e, em algumas ocasiões, acaba sendo letal. Trata-se de praticar aquilo que convencionamos chamar de comunicação preventiva – crucial em situações previsíveis de crise. Um bom exemplo é o pisca-pisca de um carro. Sabemos que a efetividade deste indicador está em sua ativação no tempo suficiente para ser visto, de forma que a manobra não surpreenda negativamente o motorista que vem logo atrás. Então, por que as organizações ainda relutam?
 
Neste ponto nos adiantamos a possíveis questionamentos que um alto executivo pode apresentar. A resposta é: o fato de não podermos contar tudo não significa que devemos não contar nada. É o momento da prudência (do latim procul videre, ou ver longe). A comunicação frequente se torna decisiva. Algo bem explicado por José Aguilar no livro “A Gestão da Mudança” (não lançado no Brasil) quando ele afirma que “a comunicação está presente na gênese, no desenvolvimento e na conclusão de toda a transformação organizacional. Mudar é comunicar e comunicar é mudar”. Tanto é verdade que se não cuidamos da comunicação em sua origem, o apocalipse da liderança chega antes e da pior forma. 
 
Prever o previsível e contar o possível de ser contado ajuda no caminho de uma comunicação correta ao mesmo tempo em que ela facilita a transição do “KO” (Knockout) para o “OK”, principalmente nos casos de crise. 
 
Ao voltarmos ao tema da iminente demissão de funcionários, se ao praticamos a tempo a comunicação preventiva, temos a oportunidade de lamentar a situação pessoalmente, enfrentando a realidade e não se escondendo através de palavras escritas e que tergiversam. Evidentemente, essa genuína ação de comunicação nada mudará o passado, mas certamente poderá construir um melhor futuro.
 
A forma é pano de fundo
 
É revelador o que nos conta Sally Squires, articulista de medicina e saúde do Washington Post. Em 1998 foi estabelecida uma nova definição de sobrepeso, que indicava a situação de pessoas que, sem chegar à condição de obesas, tinham um peso superior à proporcionalidade de sua altura. Ainda que não fosse uma descoberta, a comunicação dessa mensagem e suas consequências afetaram diretamente, apenas nos Estados Unidos, 29 milhões de pessoas. Alguns não se afetaram, outros buscaram mais informações e outros se apavoraram. Isso ilustra que a comunicação de um assunto supostamente de menor relevância pode se converter em algo de vital importância. Até informações sobre horários, calendários, lugar para estacionar o veículo, entre outros, podem ter impacto ainda maior que aqueles tidos como “nucleares”, como contratos, salários, demissões. Podemos entender com o exemplo que a forma com a qual nos comunicamos é o verdadeiro pano de fundo que deve ser levado em conta.
 
A verdade como antídoto do imperfeito
 
Uma boa comunicação não é suficiente para compensar uma má liderança. Podemos mudar a intensidade das coisas, mas não a sua essência. Comunicar um erro não o converte em um acerto, mas é um passo determinante para mitigar seus efeitos. Um dos princípios da pesquisa biomédica afirma que o que mata não é a substância, mas a dose aplicada. À medida que pratiquemos a terapia da comunicação em doenças leves, estaremos preparados para a cirurgia mais agressiva em situações de risco.
 
Nesse sentido, aprendi uma grande lição quando visitei a Universidade de Harvard. No seu guia oficial ela informa que a escultura de seu fundador instalada no campus é a “estátua das três mentiras” na qual se pode ler a frase: “John Harvard, Founder, 1638". Fato é que a figura não corresponde a John Harvard, mas a um aluno que serviu de modelo. O nome não é do personagem que fundou a Universidade, mas do primeiro de seus benfeitores. E a data não é a de sua origem. O correto seria 1636. Eloquente, principalmente em uma entidade cujo slogan é Veritas (Verdade). Trata-se de um detalhe que, comunicado dessa forma pela própria instituição, não passa de uma simpática anedota. Além disso, sua transparência é digna de elogio. A mesma realidade, quando ocultada e quando é negada pode facilmente provocar desconfiança interna e minar a reputação pública por toda uma vida. Algo parecido deve ter pensado Leonardo Castellani em “Como sobreviver intelectualmente no Século XXI”. Nele, afirma que "não há pior escândalo que querer suprimir a verdade por meio de um escândalo”.
 
Conseguir respostas sem formular perguntas
 
Não existem doenças iguais ou pacientes idênticos. Também não existem soluções de comunicação milimetricamente transplantáveis. O que pode ser uma solução de cura para uma empresa, pode não servir para outra e, pior, pode até matar, dependendo do momento, da dose, do contexto, entre outros fatores. Na série de TV “The West Wing; Nos bastidores do Poder”, foram apresentadas situações verossímeis de como gerenciar a comunicação interna e a projeção pública do Governo dos Estados Unidos. Alguns diálogos são sublimes, por sua clareza e simplicidade:
 
    - Sobre a importância de falar: se ficar quieto, o problema pode piorar. A assessora de imprensa diz ao Presidente: “Várias vezes pegaram a gente guardando segredos”. Um assessor do Presidente diz à sua secretária: “Ninguém saberá é uma frase que costuma dar muitos problemas”.
    - Sobre a importância de ficar quieto: se falar, a situação poderá se agravar. A assessora de imprensa diz ao Presidente: “Isto aqui não é notícia, mas se o senhor falar, a imprensa achará que se trata de uma grande notícia”.
    - Sobre reconhecer erros: o Presidente diz: “Estamos na Casa Branca. Se cometermos apenas dois erros antes do café da manhã, o dia será bom”.  
    - Sobre a relevância das percepções: a primeira-dama diz ao Presidente: “Você não tem o poder para resolver tudo, mas adoro ver tudo o que faz para tentar”.
    - Sobre a saturação no volume de informações que complica tudo o que deveria ser simples: “Precisamos de seis mil palavras para explicar o reembolso de uma passagem aérea”.
    - Sobre miopias e alucinações: “o bom senso em Washington é como o cimento. Quando ele endurece já não é possível fazer mais nada”.
    - Sobre a humildade e a empatia: o Presidente diz a alguns pais que perderam seus filhos. “Tenho três filhas e não sei o que dizer aos senhores”.
    - Sobre a proximidade: o Presidente diz: “Nunca fiquei nervoso ao falar em público, mas é muito comum que fique nervoso ao falar com apenas uma pessoa”.
    - Sobre a difícil arte de tentar conciliar a retórica atrativa com a realidade da qual não gostamos: a assessora de imprensa diz a colegas de gabinete antes de comparecer à sala de imprensa: “Desculpem, tenho que representar mais uma vez o meu papel”
    - Sobre o erro de pensar que o silêncio não comunica e a falta de ação é inofensiva, quando percebe que o Presidente perdeu 5% de popularidade em uma semana: “Mas não fizemos nada!”. Justamente por isso.
 
De “The West Wing” extraio ainda uma ideia útil para melhorar a comunicação da liderança: conseguir as respostas que precisamos ter ao formular perguntas que não devemos fazer. Claro, isso é possível de conseguir antes e de melhor maneira se a comunicação começar na escuta. 
 
Evitar a falta de comunicação pela saturação de informações
 
Assim como estar ao lado de pessoas não diminui a solidão, também podemos acabar vivendo distantes de uma boa comunicação pela saturação de informações. Enviar mensagens, editar boletins, convocar reuniões e participar de meios sociais pode criar um mundo estéril de ferramentas de comunicação que jamais levarão informações de real interesse às pessoas. É como se tivéssemos em mãos todos os medicamentos para as curas, mas faltasse o que de fato importa, que é a orientação de como usá-las e para quê usá-las. 
 
Outra observação está ligada ao ditado popular “em casa de ferreiro, espeto é de pau”, que faz uma analogia ao que ocorre com certos médicos que são maus pacientes, como no filme Golpe do Destino (1991). Não é exagero dizer que a comunicação deve começar na área de Comunicação. Quem trabalha em uma delas sabe sobre o que estou falando. Cabe destacar que toda terapia requer acompanhamento. A comunicação, como a saúde, não escapa a essa necessidade. Quando pensamos em tempos de paz em organizar saídas para eventuais crises, nossa margem de acerto e segurança é ampliada. Sejam quais forem os diagnósticos, as causas, os sintomas e o tratamento, a receita que sempre devemos prescrever é a consulta ao especialista frente a qualquer suspeita e à checagem periódica, mesmo que os indícios patológicos ainda não tenham sido detectados. 
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* Enrique Sueiro Villafranca (Pamplona, 1968) é doutor em Comunicação, consultor e diretor de Comunicação Científica da Universidade de Navarra, onde foi Diretor de Comunicação Interna. Trabalhou no Diário de Navarra e na Antena 3 TV (Madri). Foi diretor do Centro de Pesquisas Médicas Aplicadas (CIMA) e do Centro de Pesquisa Biomédica em Rede (CIBER) do Ministério de Ciência e Inovação da Espanha, e membro da Escola de Comunicação da Universidade de Navarra. Também foi professor do Mestrado em Saúde e Jornalismo da Universidade Complutense de Madri.  


Os artigos aqui apresentados não necessariamente refletem a opinião da Aberje e seu conteúdo é de exclusiva responsabilidade do autor. 2979

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